O desembargador Paulo Velten foi o relator do
processo (Foto: Ribamar Pinheiro)
Negar o benefício do
passe livre a uma pessoa com transtornos mentais vai de encontro a todo o
ordenamento de proteção vigente, construído pela Convenção Internacional sobre
os Direitos das Pessoas com Deficiência e pelo Estatuto da Pessoa com
Deficiência.
Com base nesse
entendimento, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) foi
favorável ao agravo de instrumento requerido por uma moradora de São Luís, para
assegurar à agravante o direito ao passe livre.
Ela ajuizou o agravo
contra decisão do Juízo da 7ª Vara da Fazenda Pública da capital, que indeferiu
pedido de antecipação de tutela referente ao direito ao benefício do passe
livre, sob fundamento de que os receituários juntados não atestam que ela seja
deficiente física ou mental.
A defesa da agravante
sustentou que ela tem transtornos mentais e comportamentais, razão pela qual
foi, por cerca de um ano, beneficiária do passe livre, suspenso após ser
submetida a perícia para renovação do benefício, ocasião em que o perito
constatou que a recorrente não se insere entre as pessoas com deficiência
mental.
O desembargador Paulo
Velten (relator), que já havia deferido a liminar em favor da agravante,
afirmou que, em que pese a Lei Municipal nº 4.328/2004 assegurar a gratuidade
no sistema de transporte aos “deficientes físicos, mentais e sensoriais”, a
norma não aponta qualquer requisito objetivo para aferição dessas deficiências,
limitando-se a apresentar conceitos abertos.
Ele citou o trecho da
norma que trata da deficiência mental, compreendida como “o funcionamento
mental inferior à média originado no período de desenvolvimento, caracterizado
por inabilidade na aprendizagem e socialização e as doenças mentais crônicas
que são impedientes de que seus portadores possam reger sua pessoa e seus bens,
os quais terminam por serem interditados judicialmente” (Art. 4º §3º).
Velten entendeu que
negar o benefício de passe livre ao fundamento de que a agravante – que é
portadora de transtornos mentais – não se enquadra no referido conceito, como
procedeu o município, vai de encontro a todo o ordenamento protetivo vigente.
Para o relator, do modo
como foi indeferido o benefício, em vez de promover “a plena e efetiva
participação dessas pessoas na sociedade”, como recomenda a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto
6.949/2009), acabou-se por promover a diferença, limitar a autonomia,
integração pessoal e acessibilidade ao meio físico da agravante, que, diante
das dificuldades mentais e financeiras, necessita do passe livre para dar
continuidade ao tratamento de saúde que realiza no Hospital Universitário da
UFMA desde janeiro de 2007.
O desembargador
concluiu que os conceitos definidos pela Lei Municipal nº 4.328/2004 devem ser
interpretados à luz dos postulados protetivos da Convenção Internacional sobre
os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, da
Constituição Federal e do Estatuto da Pessoa com Deficiência, sob pena de
violar o princípio da dignidade da pessoa humana, os deveres de respeito e
proteção dos direitos humanos.
Os desembargadores
Jaime Ferreira de Araujo e Marcelino Everton acompanharam o voto do relator.
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